Expectativas, Percepção e Realidade

20 de Maio de 2016

Aquiles Mosca mostra como somos suscetíveis a distorções da realidade, descrevendo um experimento com vinhos. A evidência é que nossa percepção é fortemente influenciada pela nossa expectativa.

Este texto ilustra a Carta Cardinal 6 (“Oh Yeah! Oh No!”), e a Carta Cardinal 9 (“Qual o melhor momento para investir em ações?”), nas quais analisamos os vieses humanos.

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Expectativas, percepção e realidade

Por Aquiles Mosca dia 14/04/2016

Provavelmente a maioria dos leitores já ouviu a expressão “percepção é realidade”. Ou seja, vemos o mundo da forma como o percebemos, muito embora tal percepção nem sempre reflita fielmente a realidade. Agora, como as percepções são formadas? Mais importante ainda, as percepções podem ser influenciadas de tal forma a alterar a imagem que temos da realidade e de suas perspectivas futuras?

As perguntas acima ganham relevância adicional na atual conjuntura, uma vez que a crise política abala a confiança de consumidores e empresários, colocando a economia em uma recessão que se estende pelo segundo ano consecutivo. Confiança nada mais é que a percepção dos agentes econômicos quanto à sua situação presente e futura.

Um estudo com vinhos pode ajudar a explicar a dinâmica mental por trás da formação de percepções da realidade.

Três pesquisadores (Pangborn, Berg e Hansen, 1963) acrescentaram secretamente um pouco de corante vermelho inodoro e insípido a um vinho branco, dando-lhe aparência de rosé. Pediram então a um grupo de enólogos que avaliasse sua doçura com relação ao mesmo vinho não tingido. Objetivamente, trata-se de experimentar o mesmo vinho, só que com coloração diferente. Como resultado os pesquisadores observaram que, para os especialistas, o falso rosé pareceu mais doce que o vinho branco, o que correspondia às expectativas que tinham mesmo antes de terem degustado os dois vinhos. O mesmo teste foi feito colocando um corante que fez o vinho parecer tinto. Novamente os enólogos, seguindo suas expectativas, notaram diferenças de sabor que de fato não existiam.

O ponto aqui não é julgar a capacidade degustativa dos enófilos, mas deixar claro que quando fazemos avaliações e medições, nosso cérebro não se fia apenas nos estímulos perceptivos diretos e objetivos. Ele integra automática e inconscientemente outras fontes de informação, dando grande peso às nossas expectativas.

Voltando à economia e aos mercados, uma mudança de percepção da realidade atual passa necessariamente por um choque de expectativas que tire os indicadores de confiança da trajetória declinante, iniciada na segunda metade de 2012, intensificada em 2015 e mantida até o período atual. Uma rápida olhada nos índices de confiança da indústria, do consumidor e do setor de serviços calculados pela FGV demonstra com clareza o movimento de queda dos últimos anos. Esperar que as coisas mudem fazendo mais do mesmo, dificilmente trará o resultado necessário sobre a reversão de percepção e expectativas, ponto de partida para qualquer recuperação da economia real.

Estimular novamente o crédito sem que consumidores e empresários tenham confiança para se endividar e assumir compromissos financeiros futuros, dado o cenário de desemprego em alta e atividade econômica deprimida, não parece ser o tal catalisador para a reversão das expectativas. Além disso, não há falta de liquidez no sistema bancário local. Pelo contrário. O comportamento recente dos prêmios pagos pelos depósitos bancários revela a situação confortável de liquidez no sistema. O que há é uma percepção de risco elevada, que impulsiona tanto tomadores como doadores de recursos a se retraírem à espera de um cenário mais claro. A famosa barba foi colocada de molho.

Expandir o gasto público às custas de um déficit maior, e consequentemente mais endividamento, também não resolve a questão das percepções deterioradas. Pelo contrário, pode até reforçar o pessimismo com o futuro, dada a já frágil situação fiscal corrente.

O equivalente ao efeito do corante dos experimentos acima, capaz de alterar a percepção com relação à realidade futura, parece estar necessariamente em um programa amplo de reformas estruturais macro e microeconômicas.

Para tanto, é imprescindível que conte com o apoio da maioria no Congresso para que seja percebido como crível em sua aprovação e implementação. Os pontos a serem atacados são velhos conhecidos. Reforma da previdência, tributária, ajuste fiscal que estabilize e em seguida coloque a dívida pública em relação ao PIB em trajetória declinante, reorganização das agências reguladoras etc. Apenas dessa forma teremos uma recuperação do ambiente econômico capaz de gerar a previsibilidade necessária à retomada do crescimento econômico.

Aquiles Mosca é estrategista de investimentos pessoais e superintendente-executivo comercial do Santander Asset Management. É autor dos livros “Investimentos sob medida” e “Finanças Comportamentais”. Preside o Comitê de Educação de Investidores da Anbima.

Email: aquiles.mosca@santanderam.com

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.


Endereço da página:  http://www.valor.com.br/financas/4523059/expectativas-percepcao-e-realidade

Fonte da Imagem: Photo by henry fournier on Unsplash

Construção de Marca – Steve Jobs

Fonte da Imagem: By matt buchanan (originally posted to Flickr as Apple iPad Event) , via Wikimedia Commons
20 de Maio de 2016

Ele apresenta o lançamento da histórica campanha “Think Different”, que restaurou a força da marca Apple. Ele discorre sobre o que é marca, trazendo grandes lições de propaganda, como da Nike e do setor de leite. Por fim, apresenta o valor fundamental da sua marca.

Este tema ilustra a Carta Cardinal 2 (“Pêndulo do sentimento do investidor”), a Carta Cardinal 5 (“Como crescer na recessão?”) e a Carta Cardinal 11  (“Estratégia ≠ Eficiência Operacional”), em que discutimos sobre Alpargatas, Arezzo e Portobello, respectivamente, empresas com marca.

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Lava Jato muda a Justiça e a Advocacia

20 de Maio de 2016

Joaquim Falcão apresenta sua opinião de que o funcionamento da Justiça penal mudou para melhor após o Mensalão e a Operação Lava Jato. São mudanças geracional, de doutrina, de estratégia e de cooperação internacional. A consequência é a baixa taxa de sucesso dos advogados de defesa, levando a delações e a acordos de leniência.

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Lava Jato muda a Justiça e a advocacia

Por Joaquim Falcão dia 31/07/2015

A Justiça penal não será a mesma depois do mensalão e da Operação Lava Jato. Tanto a prática de juízes, delegados, procuradores e advogados como nas doutrinas e tribunais. Tudo começa a mudar. Que mudanças são essas?

Mudança geracional. Juízes, procuradores, delegados são mais jovens. Fizeram concurso mais cedo. Vivem na liberdade de imprensa, na decadência dos partidos e na indignante apropriação privada dos bens públicos. E não têm passado a proteger ou a temer.

Dão mais prioridade aos fatos que às doutrinas. Mais pragmatismo e menos bacharelismo. Mais a evidência dos autos –documentos, emails, planilhas, testemunhos, registros– do que a lições de manuais estrangeiros ou relacionamento de advogados com tribunais.

Erram aqui e acolá. Às vezes, extrapolam, mas passaram por duro aprendizado institucional com Banestado, Castelo de Areia, Furacão e outras operações. Atentos,buscam evitar nulidades processuais. O juiz, e não mais os advogados, conduz o processo.

Usam de múltiplas estratégias. Jurídica, política e comunicativa. Valorizam a forçadas imagens, que entram, via internet, televisão, lares e ruas, nos autos e tribunais.

São informados e cosmopolitas. Organizam cooperação internacional com Suíça, Holanda e Estados Unidos. É difícil para a tradicional advocacia individual enfrentar essa complexa articulação entre instituições. Usam com desenvoltura a tecnologia. Extraem inteligência de “big data” (análise de grandes volumes de informação). Aplicam-se em finanças e contabilidade.

As consequências para a advocacia são várias. Plantar nulidades para colher prescrição –o juiz não seria competente, a defesa foi cerceada, o delegado extrapolou poder investigatório etc.– é estratégia agora arriscada. Tribunais superiores não suportam mais serem “engavetadores” de casos que chegam quase prescritos. Diminuem-se diante do olhar da opinião pública.

Apostar que juízes, procuradores e delegados agem com arbítrio, ferem direitos fundamentais dos réus, sem clara e fundamentada evidência, é protesto que se dissolve no ar.

Algumas defesas tentam politizar o julgamento. Juízes, delegados e procuradores agiriam a serviço do governo ou dos políticos envolvidos. Colocam suas fichas que no Supremo Tribunal Federal tudo se resolveria politicamente. É tentativa possível. Nunca deixará de ser. Mas hoje o sucesso é menos provável.

O invisível ministro Teori Zavascki não dá mostras de vergar. Até agora não se conseguiu colocar Curitiba contra Brasília. Nem viceversa.

Neste cenário, como em todos os países, a defesa preferencial dos réus tem sido a minimizadora de riscos. Contabilizar perdas e danos.

Por isso aceitam a delação. Amortecem as condenações individuais dos executivos, oferecendo o apoio empresarial às famílias. Fazem acordo de leniência. Pagam alguns bilhões via Controladoria Geral da União. Vendem ou remodelam as empresas. Assim o país se encontra com nova Justiça e advocacia penal no Estado democrático de Direito.

JOAQUIM FALCÃO, 71, mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA) e doutor em educação pela Universidade de Genebra, é professor da FGV Direito Rio

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Fonte da Imagem: Foto por Geoffrey Whiteway